A EGIPICIA

 

Enquanto temos de um lado a submissão que significa estar sobre uma missão, do outro temos a subversão que é a derrubada de  direitos, pensamentos, costumes e etc. Esse paradigma levanta uma discussão entre submeter-se a uma determinada condição e a imposição.  Tal dilema é criado na cabeça de algumas mulheres que devido a cultura e a tradição de seus países não sabem como se posicionar e acabam se submetendo a princípios que muitas vezes vão contra o que ela própria pensa.

Podemos citar algumas tradições como por exemplo, o uso do lenço na cabeça (hijab) para esconder o cabelo da mulher para que outros homens não vejam aquilo que para cultura de alguns países simboliza a beleza da mulher, e que deve ser mostrada somente ao seu marido. Temos também a burca, um aparato que esconde todo rosto da mulher simbolizando que a face da mulher deve ser vista somente pelo seu marido.


Surge o questionamento sobre como pensam essas mulheres, aceitam de bom senso ou questionam? O que podemos debater é porque tais princípios se aplicam somente às mulheres mais aos homens nada. As mulheres não são de forma nenhuma menores que os homens, a missão delas é estar ao lado deles e não abaixo ou acima. Existem vários relatos de mulheres que romperam com a cultura de seus países por não concordarem com a imposição de determinadas regras. Precisamos entender o que passa na cabeça da mulher, não que seja um ser diferente, mas tem suas particularidades que precisam ser respeitadas.




Toda mulher precisa e gosta de ser valorizada e respeitada, mas infelizmente ainda é vista como sexo frágil e objeto de desejo. É claro que todos nós gostamos de ser desejados, não estou descartando tal coisa, mas sabemos que para a mulher isso é muito mais difícil quando passa a ser julgada pela roupa que veste ou tem que vestir, pela maquiagem e por seu comportamento. Na verdade, seu exterior deveria ser menos valorizado do que o interior, afinal, a beleza externa é fruto do que está por dentro, no caso, a inteligência, o coração e o espiritual. São coisas que dificilmente  serão avaliadas em primeiro plano em uma mulher.


“Como seria o seu príncipe encantado?” A julgar pelo conteúdo da conversa, você facilmente apostaria se tratar de um papo entre adolescentes. Mas no Egito, presenciei tal conversa entre amigas na casa dos 30 anos de idade. Tais mulheres podem ser consideradas uma minoria na sociedade egípcia, pois fizeram faculdade, trabalham, e mesmo se aproximando dos temidos 30 anos de idade, ainda não se casaram. Se os homens nesta faixa etária passam a sentir a pressão do “está ficando para titio”, as mulheres então, para eles, já estão mais para tias-avós.
No geral, não se deposita maiores expectativas em uma mulher senão a de casar e ter filhos. Sem grandes deslumbres com relação ao futuro, a maioria delas passa a adolescência a vislumbrar um perfeito casamento. Na verdade, esse será um dos únicos grandes acontecimentos que ela viverá ao longo da vida.




Muitas meninas são educadas nas melhores escolas, frequentam renomadas universidades, falam inglês fluentemente – o que no Egito é um importante indicador social – tudo isso para ter uma brilhante carreira, certo? Não para a maioria. Os pais investem em tudo isso para garantir que suas filhas encontrem um bom pretendente, pois raramente classes sociais se misturam quando o assunto é casamento. Para garantir um ‘bom marido’, ela precisa passar uma boa impressão.
E esse acaba se tornando o grande dilema de mulheres como as que citei acima; elas têm tudo o que precisam para andar com as próprias pernas, mas sabem que quando se casarem terão que abrir mão disso para uma vida no lar.
A grande parte das mulheres que conheço trabalhava até se casar. Querendo ou não, elas saem da responsabilidade de um homem para o outro, pois como costumam repetir em alto e bom tom: “da casa do pai para a do marido, de lá para o túmulo”.

Logo após a resposta sonhadora da pergunta que abre o texto, corremos todas para juntar nossas coisas e partir da piscina (só para mulheres) onde estávamos, afinal, o horário máximo que elas podem chegar em casa é às 20:30, em um país onde a vida praticamente começa nesse horário.
É possível que você esteja questionando o que estou contando aqui, afinal, no Egito a mulher já conquistou o direito ao divórcio, entre outras coisas. Mas digo que se o direito é concedido por lei, na sociedade isso ainda é um estigma para se carregar.




Para se ter ideia, até os anos 90 o marido podia se divorciar da mulher sem o conhecimento dela – que era notificada por carta -, assim como ele também podia se casar com a segunda, terceira e quarta esposas, sem que a primeira soubesse. Deram-se passos lentos em direção à conquista desses direitos,
 mas desde o ano 2000 elas já podem pedir o divórcio, contanto que abram mão de tudo o que tinham direito enquanto casadas: bens e ouro, por exemplo.
Uma dessas mulheres da conversa que mencionei é divorciada. Já não tinha como as outras o sonho de encontrar o príncipe encantado. Para ela, nesse momento, encontrar alguém que a respeite já seria uma grande conquista. 
Em uma sociedade onde a virgindade é condição de honra para uma mulher, uma divorciada se torna alvo fácil de aproveitadores. Eu mesma escutei da boca de um egípcio: “Por que eu vou casar com uma usada se posso ter uma nova?”. Vai por aí…
Os assédios não param nas palavras. Um estudo das Nações Unidas constatou que 99,3% das mulheres egípcias já foram assediadas sexualmente e em menos de 10 dias por lá, eu entrei para a estatística. A mentalidade coletiva culpa a mulher por qualquer coisa que aconteça com ela. Mas o que dizer de um homem que assedia uma mulher toda coberta e com um filho nos braços? O que teria ela feito para merecer isso? Não importa, pois mesmo tendo sido abusada, a culpa é dela por ter perdido a “honra”. A honra é crucial para se casar e se casar é crucial para elas.


O filme 
Cairo 678 retrata tal situação e vale a pena ser assistido por toda mulher. Concomitantemente, narra histórias reais de três mulheres de diferentes classes sociais, mas que se encontram pelo problema em comum. Uma delas foi a primeira mulher a ter coragem de fazer uma denúncia formal contra o assediador, sofrendo represálias inclusive da família e do noivo. Mesmo com o exemplo de Nelly, o número de mulheres que seguem seus passos é muito pequeno.
Obviamente toda generalização é mentirosa e é por isso que insisto em usar a palavra ‘maioria’. 
Na contramão dessa sociedade encontramos diversas mulheres na política, ciências e não menos digno de reconhecimento, nos mercadinhos, nas ruas vendendo frutas, pão e o que mais ajudar a colocar comida em casa.

Mas o que será que elas pensam sobre tudo isso?

Bom, para a maioria das minhas amigas egípcias esse é o curso da vida e a coitada sou eu, pois alguém espera que eu trabalhe para pagar minhas contas. A grande queixa delas não é em relação à idependência,  o que realmente as incomoda é a questão do assédio.

Considerando que 90% dos egípcios são muçulmanos, como professa a Sura 4:43 do Alcorão: “os homens são os protetores das mulheres porque Deus dotou uns com mais do que os outros e pelo sustento do seu pecúlio. 


As boas esposas são as devotas que guardam na ausência (do marido), o segredo que Deus ordenou que fosse guardado.” Então, há algo mais honrado do que querer agradar a Deus?

Bom, para a maioria das minhas amigas egípcias esse é o curso da vida e a coitada sou eu, pois alguém espera que eu trabalhe para pagar minhas contas. A grande queixa delas não é em relação à idependência,  o que realmente as incomoda é a questão do assédio.


“Defino amor como carinho e misericórdia, e me sinto uma pessoa muito amada”






Obviamente toda generalização é mentirosa e é por isso que insisto em usar a palavra ‘maioria’. Na contramão dessa sociedade encontramos diversas mulheres na política, ciências e não menos digno de reconhecimento, nos mercadinhos, nas ruas vendendo frutas, pão e o que mais ajudar a colocar comida em casa.

O que se pode notar é que as mulheres inseridas no mercado de trabalho ou pertencem a uma parcela ínfima da sociedade, mais abastada financeiramente e que já possui influências do estilo de vida europeu, ou são muito pobres e realmente dependem disso para viver.


“ A felicidade para mim é relativa a estar satisfeita com o que estou fazendo e feliz com o que escolhi. Dependendo do momento que passo, posso ou não estar feliz”.










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